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03 agosto, 2009

Teoria da Conspiração: Parte IV - John Lennon, Mark Chapman e o Apanhador no Campo de Centeio.

"Escrito pelo ex-escritor" J.D. Salinger, um autor que não se deixar fotografar, não gosta de imprensa, nem de se expôr, "O Apanhador no Campo de Centeio", romance mais famoso de Salinger, retrata as dúvidas e fantasias de um adolescente dos anos 1950.

Embora escrito num tom lacrimoso de auto-ajuda (ou, talvez, exatamente por isso), o livro virou cult no mundo inteiro. O curioso é que a obra de Salinger foi achada na casa de dois notórios malucos:
Mark Chapman, o assassino de John Lennon e John Hincley Jr., o homem que atirou no presidente americano Ronald Reagan para supostamente chamar a atenção da atriz Judie Foster, também tinha um exemplar do livro de Salinger em casa.

Algumas pessoas dizem que o livro é programado para abrir a mente dos matadores "pré-programados" e eles concluirem a sua missão.

A missão ficaria “adormecida” na mente do assassino, como uma espécie de vírus de computador psíquico, até que ele lesse o livro e acionasse a programação.

Jurado de morte na prisão, Mark David Chapman recusa a liberdade condicional. É ele o autor do disparo que matou o ex-Beatle John Lennon, em 1980. Nas mãos do assassino, um exemplar de O apanhador no campo de centeio. Teria sido o personagem do livro – segundo ele – que inspirou-lhe a cometer o crime. “Grande parte de mim é Holden Caulfield. Outra parte deve ser o demônio”, contou à polícia. Apesar de Chapman ter culpado parte do romance pelo sangue derramado, a rebeldia inaugurada na narrativa de Salinger está longe de estimular a barbárie.

Logo após a morte de Lennon, as vendas do clássico dispararam, até firmar-se como best-seller e leitura obrigatória. Todo mundo queria saber quem era Holden Caulfield. O que tinha de tão curioso a ponto de inspirar um assassino? O personagem é um simples adolescente de 17 anos, recém-expulso do colégio por mau desempenho. É depressivo, mente e sofre com a própria instabilidade emocional. Tão inocente quanto as brigas nas quais se envolve. Alimenta afetos e ódios, entre picos e quedas. Não tem sonhos concretos, nem planos para o futuro. Apenas vontades passageiras. Tudo o deprime – estado que alimenta ainda mais sua rebeldia.

Nada em Caulfield inspira admiração, embora sua marginalidade não seja gratuita. No seu perfil desajustado, gerações de jovens continuam encontrando um espelho. Participam de sua angústia e criam coragem para assumir a própria impulsividade. Até os anos 1950, ser imaturo era sinônimo de fraqueza. O poeta francês Arthur Rimbaud (1854-1891) escreveu que ninguém é sério aos 17 anos. Lá pela década de 1920, uma criança passava a ser adulta quando ganhava a primeira calça comprida, geralmente no Natal. Era motivo de orgulho, para o presenteado, deixar de ser um “tolo inexperiente” para cair no mundo como alguém de verdade. Largava a escola para trabalhar, aos 14 anos – no rastro da Revolução Industrial –, pronto para casar-se e formar uma família. Num salto olímpico, pulava totalmente a transição da infância para a fase adulta. Em vez de viver a adolescência, se deparava com a pura responsabilidade.

Mas a necessidade de formar adultos precoces perdeu o sentido após a Segunda Guerra. Com o despontar do capital intelectual, os jovens puderam prolongar os estudos, sem precisar trabalhar. Lá estavam eles, com barba feita, ocupados com festas e garotas. Nada de pressões sociais. Tudo o que queriam era uma Coca-Cola com whisky: aqui e agora. Mas o comportamento imaturo ainda não tinha crédito na sociedade – quanto menos na literatura, a porta-voz da experiência. Caulfield vem para legitimar a rebeldia adolescente, intolerada pelas comunidades “crescidas”. Ocupou o vazio de identidade do começo do século XX, junto de ídolos como Elvis Presley. Música, moda e tribos urbanas passaram a ser instrumentos de auto-afirmação. Assim, a juventude ganhou o respeito adulto, oportunidade para que O apanhador no campo de centeio fosse compreendido.

Salinger, ao escrever, não imaginava o estrondoso sucesso que viria. Se soubesse, talvez não tivesse sido capaz de criar um romance tão despretencioso e modestamente banal. Até porque levou uma vida semelhante à de seu personagem, anti-social. A narração em primeira pessoa é repleta de gírias e expressões jovens. Fatos triviais e divagações seguem sem respiro. É assim que o personagem vomita sua inocência. Embora transcorrido nos anos 50, o romance parece não ter época. Poderia ser adaptado, tranqüilamente, para qualquer década posterior. A ausência de sinais do passado, exceto por uma máquina de escrever, evidencia que o romance não envelheceu, como ocorre com os clássicos estabelecidos.

Embora seja um hino da revolta juvenil, O apanhador no campo de centeio também é lido por marmanjos. Não é preciso ser jovem para identificar-se com o anti-herói, rebelado contra a sociedade. Prova disso é que o cinema e a própria literatura criaram Caulfields mais velhos – e igualmente intempestivos. O personagem de O Náufrago, de Thomas Bernhard, chega à ruína interior ao deparar-se com um gênio do piano, Glenn Gould. Estar abaixo dele já é motivo para sentir-se um acidente de percurso. Na sétima arte, Stanley Kubrick repetiu a saga do homem rebelado. As obras-primas Laranja Mecânica, O Iluminado e Barry Lindon recriam escórias humanas.

Em nenhum momento, contudo, o livro de Salinger faz apologia à violência ou ao ódio. O cartão-verde para a rebeldia não justifica qualquer crime, ao contrário do que entendeu o assassino de Lennon. Ele levou ao pé da letra as revoltas passageiras do personagem, das quais o próprio se arrependeria. Ao contrário do criminoso, Caulfield não sofria de esquizofrenia e doença mental. Chapman teria se inspirado em qualquer símbolo da incompreensão jovem para justificar seus demônios.

Além disso, o personagem encontra os primeiros sinais do equilíbrio no amor pela irmã caçula, Phoebe. Quando ela lhe instiga a pensar no que gostaria de fazer no futuro, Caulfield se imagina observando crianças brincarem em um campo de centeio, atento para apanhá-las antes que caiam em um abismo. É o que deseja ser. Um trecho do livro reflete esse ritual de passagem: “O homem imaturo é aquele que quer morrer gloriosamente por uma causa. O maduro contenta-se em viver humildemente por ela”.

Desponta, aí, o senso de proteção que o faz desistir de qualquer maluquice. Seu planos de fuga eterna vão por água abaixo, diante de uma criança que o imita. Alguém precisa tomar as rédeas da loucura, sentir-se responsável pela ordem. E precisa ser ele. Nasce um novo Caulfield, feliz e sereno. Mesmo indiferente sobre o futuro, longe das pressões da fase pré-adulta: ganhar dinheiro e escolher uma profissão. Certamente, Caulfield tardaria para definir-se socialmente. Mas, por outro lado, estaria longe de tornar-se um médico frustrado ou um advogado anti-ético. Ambos, produtos precoces da modernidade.

'O Apanhador' e cia...

- Além da música Who Wrote Holden Caulfield? (Kerplunk!, de 1992), o Green Day faz referências a Holden Caulfield nos cinco álbuns da banda.

- A letra de In Hiding, do Pearl Jam, fala sobre tentar achar a casa de Salinger. Eddie Vedder disse ao NME que, no fundo, é uma metáfora sobre tentar encontrar a casa de Deus, "como se Ele fosse um recluso; você encontra a casa Dele, abre Sua caixa de correspondência e descobre que está cheia de junk mail".

- Quando perguntaram a Mark Chapman por que ele matara John Lennon, o perturado-mental-ou-pau-mandado-da-CIA disse: "Leia O Apanhador no Campo de Centeio e você descobrirá porque o fiz. Esse livro é meu argumento".

- Em uma referência a Chapman, o filme Teoria da Conspiração traz Mel Gibson no papel de um lunático que compra todas as cópias de O Apanhador... que consegue encontrar, sem nunca ter lido o livro.

- A Disney tem um projeto de produzir uma versão animada de O Apanhador... com um pastor alemão como Holden Caulfield... (que Deus nos livre e o santo Salinger proiba todo esse lixo!).

- A banda americana The Caulfields.

- A gravadora indie Caulfield Records (PO Box 84323 Lincoln, NE 68501 USA).

- A cantora Lisa Loeb fundou a banda Nine Stories, título de um dos livros de Salinger.

- Bill Halley and his Comets gravaram a homenagem a Salinger Rocking Through The Rye (1958).


Para baixar e ler:


Jerome_David_Salinger_-_O_apanhador_no_campo_de_centeio

3 comentários:

almi_prado disse...

Exelente materia!!! e blog idem do tipo add no favoritos
;D

Jessica Rose disse...

Olá!
Você que escreveu os textos?
Se foi, parabéns!Você escreve muito bem, tem conhecimento dos assuntos tratados e expôs fatos novos, que eu ainda não conhecia, mesmo sendo uma apaixonada por tudo que remeta a rock and roll e literatura.
E muito boa a idéia de disponibilizar o link do livro para Download... Comecei a lê-lo meses atrás, mas como não me sobra muito tempo no computador atualmente, vou tentar pegá-lo emprestado na biblioteca da minha faculdade.Assim posso lê-lo nas minhas viagens.. hehe

Obrigada pelo ótimo blog e pelas informações, aliás o conhecimento é o alimento da vida.
Parabéns pela iniciativa!

Abraços

Anônimo disse...

Bem legal o blog só a letra branca em fundo preto que bem desconfortavel de ler.

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